segunda-feira, 29 de junho de 2015

Fundamentos da Decisão #7: o caso do atirador de teia na Suprema Corte americana


Tanto nos EUA quanto no Brasil o prazo de proteção para patentes de invenção é de 20 anos a partir da data do seu depósito. No Brasil isso é regulado pelo artigo 40 da lei 9.279/96 enquanto que na legislação americana essa disposição pode ser encontrada no §154 de seu código de patentes. Passados esses 20 anos a patente entra em domínio público, significando que qualquer um poderá fazer uso dela sem nada dever ao seu criador.

É nesse sentido que a Suprema Corte de Justiça americana julgou, no último dia 22.06.2015, um litígio envolvendo a Marvel e o criador do atirador de teia (foto). Nos anos 1990 Stephen Kimble inventou e registrou um dispositivo de pulso que permitia aos seus usuários atirar um fluído de espuma que lembrava a consistência de uma teia de aranha. A Marvel, interessada no invento, adquiriu a patente e estabeleceu em contrato, a título de royalties, o pagamento para Stephen de uma percentagem de 3% sobre o lucro obtido com a venda do brinquedo de teia.

Contudo, em decorrência do caso Brulotte, ficou determinado não ser mais necessário o pagamento de roylties ao inventor após a patente ter entrado em domínio público. Por esse motivo, em 2010, a Marvel buscou a anulação judicial desse contrato findos os 20 anos de proteção. Kimble, após o processo resultante ter chegado às instâncias superiores, buscou a revisão do preceito estabelecido pelo caso Brulotte, argumentando que os contratos deveriam ser considerados caso a caso, permitindo às partes negociar royalties mesmo após o prazo de proteção. Entretanto, pela teoria do Stare Decisis, a Suprema Corte manteve o preceito de que findo o prazo de proteção não seria mais necessário pagar o valor devido à título de roylaties.

Inclusive, o último parágrafo da decisão traz uma citação curiosa:
O que nós podemos decidir, podemos decidir ao contrário. Porém a stare decisis nos ensina que devemos exercitar tal autoridade de maneira comedida. Cf. S. Lee e S. Ditko, Amazing Fantasy No. 15: "Homem-Aranha", p. 13 (1962) ("Nesse mundo, com grande poder deve também vir grande responsabilidade"). Achando várias razões para manter o preceito em seu curso e sem "justificativas especiais" para mudá-lo, rejeitamos o pedido de Kimble para mudar o preceito Brulotte. (p. 21) 
Assim, a Suprema Corte considerou a mudança do precedente nesse caso impossível, tendo em vista ser uma decisão que exige grande responsabilidade e que não seria aplicável no caso. Essa decisão serve para reafirmar o objetivo do Direito da Propriedade Intelectual: permitir a inovação por meio da proteção temporária ao invento e a disseminação da tecnologia permitindo ao público utilizá-la livremente após o prazo de proteção.

sexta-feira, 26 de junho de 2015

Novo Decreto regulamenta a atuação do ECAD e de entidades de gestão coletiva de Direitos Autorais


A antiga Lei de Direito de Autor (nº 5.988/73) regulamentava, entre outras coisas, a atuação do ECAD, entidade privada, por meio do Conselho Nacional do Direito Autoral, órgão estatal responsável por gerir os direitos autorais no Brasil desde os anos 70. Contudo, com o fechamento desse órgão pelo então presidente Fernando Collor, na década de 1990, o ECAD passou a ter o monopólio da gestão coletiva dos Direitos de Autor sem nenhum tipo de controle por parte do Estado, o que ensejou em abusos.

Com isso em mente, publicou-se no dia 23.06.2015 o Decreto nº 8.469, o qual regulamenta a gestão coletiva de direitos autorais, recentemente reformada pela Lei nº 12.853/13. O objetivo desse decreto é estabelecer critérios específicos, aos quais entidades de gestão coletiva como o ECAD deverão se submeter, para a cobrança de valores referentes à execuções musicais.

Entre as condições estabelecidas pela lei destaca-se a necessidade de habilitação no MinC, a existência de rol definido de músicas e artistas sobre os quais a entidade possa realizar cobrança de direitos de autor, além de maior repasse dos valores arrecadados para os artistas. A lei visa conferir maior transparência ao procedimento de arrecadação e distribuição desses valores estabelecendo, da mesma forma, comissões permanentes para o aprimoramento da gestão coletiva e sanções para as entidades que não se submeterem às medidas do Decreto.

Ainda que haja divergência entre artistas acerca das disposições da nova lei, não há dúvidas de que esse Decreto veio para corrigir um erro histórico. A determinação estatal do monopólio da gestão coletiva dos Direitos de Autor para o ECAD já era temerário, mas fechar o único órgão estatal que o regulamentava ensejou situações em que passou a se questionar se a atuação do Escritório Central visava efetivamente ao bem dos artistas. Por esse motivo esse Decreto é recebido como uma boa notícia, ao estabelecer critérios mais específicos e tangíveis para a cobrança de valores relativos aos direitos patrimoniais dos titulares de obras.

segunda-feira, 22 de junho de 2015

Austrália aprova novas medidas para coibir o download ilegal de conteúdo

A Austrália possui um dos maiores índices de downloads ilegais de conteúdo no mundo. Problemas de distribuição, conveniência, opções legais limitadas e conivência de provedores de acesso à rede locais são apenas alguns dos fatores que contribuem para que esse país seja um dos que mais contribuem para a chamada "pirataria digital".

Com isso em mente, no último dia 22 de junho o Senado australiano aprovou emenda ao seu Copyright Act de 1968. Tendo em vista que maior que grande parte do conteúdo ilegal ao qual os australianos tem acesso provem de websites de fora do país, essa emenda se propõe a coibir justamente essa prática.

A redação da emenda, de apenas 9 páginas, estabelece que a Corte Federal da Austrália pode garantir uma injunção para bloquear websites estrangeiros a nível dos provedores de acesso à rede caso seja detectado que certa página disponibilize conteúdo ilegal para australianos. Tal lei gerou inúmeras críticas, especialmente por parte de usuários de sistemas VPN, pela ausência de exceção ao uso desse tipo de sistema na redação da emenda, o que pode fazer esse tipo de serviço ser alvo de bloqueio. Usuários de programas VPN são muitas vezes taxados como "piratas" somente porque buscam conteúdo de fonte legal (ex: Netflix) em outro país que não o seu.

Resta agora saber como essa lei será utilizada e se a justiça australiana buscará uma aplicação harmoniosa da lei para não prejudicar quem utilize serviços de outros países legitimamente.

terça-feira, 16 de junho de 2015

Violação de Direito Autoral pode ser comprovada por perícia?

O Código Penal brasileiro (DL 2.848/40) estabelece em seu artigo 184, §2º, que está sujeito  a pena de reclusão de 2  a 4 anos e multa quem:
com o intuito de lucro direto ou indireto, distribui, vende, expõe à venda, aluga, introduz no País, adquire, oculta, tem em depósito, original ou cópia de obra intelectual ou fonograma reproduzido com violação do direito de autor, do direito de artista intérprete ou executante ou do direito do produtor de fonograma, ou, ainda, aluga original ou cópia de obra intelectual ou fonograma, sem a expressa autorização dos titulares dos direitos ou de quem os represente.
Um questionamento que pode ser levantado acerca desse dispositivo é como se comprovar se realmente houve violação do direito autoral, além de sua vítima, somente pela produção de provas documentais. Para responder a essa questão O ministro Rogerio Schietti Cruz afetou à Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) o julgamento de dois recursos repetitivos, referentes ao REsp 1456239 e ao REsp 1485832.

Cadastrado no sistema de repetitivos sob o número 926 o objetivo desse questionamento é saber se  a materialidade do crime previsto no art. 184, § 2º, do Código Penal pode ser comprovada mediante laudo pericial feito por amostragem do produto apreendido, se a falsidade pode ser atestada por meio das características externas desse material e se é necessária a identificação dos titulares dos direitos autorais violados. Tal decisão do ministro decorre da grande quantidade de recursos os quais questionavam as provas documentais produzidas, seja pela ausência de comprovação da falsidade do produto ou até mesmo de comprovação de que o titular da prova copiada realmente sofrera algum dano.

Quando afetado o tema, processos de similar teor deverão ser suspensos no 2º grau, sendo posteriormente negado seguimento daqueles que apresentem fundamentação contrária, quando definida a tese pelo STJ. Esse posicionamento do tribunal certamente facilitará a fase de produção de provas em crimes de contrafação no direito de autor, tendo em vista que por depender de muitos aspectos subjetivos para seu julgamento, somente a produção de provas orais e documentais é insuficiente.

sexta-feira, 12 de junho de 2015

Exposições de Alvin Toffler sobre o fenômeno da Terceira Onda


Alvin Toffler é escritor e futurista dos americano nascido em 1928 e versado nas áreas da Ciência, Letras e Direito, tendo diplomas em todas as três. Seus trabalhos mais famosos se focam em expor e explicar o que seria a Terceira Onda, fenômeno retratado em seu livro best-seller com o mesmo nome. Na indicação de vídeo de hoje, portanto, tem-se esse autor comentando sobre a revolução digital trazida por esse fenômeno, suas influências e o modo pelo qual a sociedade deve se adaptar a ele, com especial enfoque na área de educação.

terça-feira, 9 de junho de 2015

Apple Music: serviço de streaming que promete revolucionar a relação entre artistas e fãs

Fonte: http://www.apple.com/br/music/

Seguindo a linha do crescimento do uso de serviços de streaming a Apple anunciou no último dia 08.06 seu serviço intitulado "Apple Music". O anúncio foi feito durante o WWDC 2015 (World Wide Developers Conference), evento realizado anualmente pela empresa voltado para desenvolvedores de programas. O sistema surge para competir com outras empresas que já atuam no ramo do streaming de música como Rdio, Deezer, Spotify e Tidal.

O serviço oferecerá três modalidades. O primeiro é o streaming de músicas em si, no qual se cria uma playlist a partir do enorme catálogo disponibilizado. O segundo é um serviço de rádio online, estações virtuais dirigidas por DJs que podem ser acessadas de qualquer lugar do mundo, denominadas de "Beats 1". Até esse momento nada mais inovador que seus concorrentes diretos, que já oferecem esse tipo de modalidade.

Contudo, o que mais chamou atenção foi o serviço "Connect". De acordo com a própria Apple o objetivo desse é possibilitar que os artistas entrem em contato direto com seus fãs, permitindo que esses divulguem letras de músicas, fotos, vídeos e até mesmo canções inéditas diretamente para seus seguidores.

Essa perspectiva é fascinante, pois operacionalizada a tão desejada conexão direta entre artistas e fãs, até então muito dependente do intermédio de grandes produtoras como EMI, Universal, Warner, etc, as quais ficam com grande parcela do lucro proveniente da reprodução de músicas.

Se o serviço da Apple conseguirá competir com os já existentes e se o 'Connect' revolucionará o modo como artistas e fãs se relacionam são respostas que só passarão a ser respondidas a partir do dia 30.06.2015, data de lançamento mundial do serviço.


domingo, 7 de junho de 2015

Amazon: o pensamento inovador de Jeff Bezos em 1997 e 2014

Inovação é uma palavra muito importante quando se fala do âmbito da propriedade intelectual. Pensando nisso o enfoque deste post são entrevistas realizadas com Jeff Bezos, fundador e CEO da Amazon.com. Esta é uma empresa de comércio eletrônico fundada em 1994 cuja visão é "ser a empresa mais centrada no consumidor; construir um lugar onde pessoas possam vir para descobrir qualquer coisa que venham a querer comprar online".
 
A primeira entrevista foi realizada em 1997 e nela Jeff fala um pouco sobre a então inovação que era a internet e seu potencial para os anos futuros.
 
 
Desde a escolha dos produtos a serem vendidos, passando pela publicidade e pela divulgação da marca, seus comentários sobre a internet em 1997 não poderiam ser mais atuais. Já o segundo vídeo é de uma entrevista dada por ele ano passado ao programa "60 Minutes" da CBS. Neste, mostra-se o funcionamento da empresa, em especial nos EUA, e um pouco mais da visão de mundo de seu CEO.
 

O que mais me chama atenção é o modo de se fazer negócios centrado nos consumidores; esse é um aspecto muito ressaltado pelo CEO da Amazon. Com o desenvolvimento da internet saber o que os clientes querem tornou-se ainda mais fácil e isso é característica marcante dessa empresa, a qual sabe que só se manterá no mercado enquanto fornecer um serviço eficiente e de alta qualidade. Jeff Bezos, para tanto, sabe que deve sempre buscar novos e melhores modos de se atender seu consumidor com base nas novas tecnologias e nas novas maneiras de interação trazidas pela sociedade de atualmente.

sexta-feira, 5 de junho de 2015

Richard Prince: originalidade vs. usurpação e os termos de uso do Instagram

Marco Scozzaro/Frieze
Richard Prince é um artista contemporâneo de 65 anos que recentemente se envolveu em polêmica por conta de uma de suas últimas exposições. Sua exibição "New Portraits", realizada em uma feira de arte de Nova Iorque, era composta de fotos retiradas do perfil do Instragram de outras pessoas. Um detalhe interessante foi que o artista, após a exposição, colocou as fotos à venda por 90 mil dólares cada "quadro".

Uma questão relevante de ser levantada é se ele poderia ter feito tal exibição e a posterior venda dessas fotos sem a autorização dos usuários que as postaram. Verificando os termos de uso do Instragram percebe-se que o usuário que decide fazer o upload de uma foto ao programa concede a essa empresa uma licença não-exclusiva, gratuita, transferível, sub-licenciável e mundial de uso da imagem. Contudo, analisando-se a política de privacidade do programa nota-se seu comprometimento em não alugar nem vender esse tipo de conteúdo a terceiros fora do Instagram sem a autorização do usuário. 

Assim, ainda que as fotos tenham sido retiradas de um programa disponível na web, para realizar seu uso e venda Richard Prince necessitava da autorização dos usuários do programa que fizeram o upload original dessas fotos. Porém, ainda que a apropriação das imagens de outros seja evidente e que sua venda tenha sido indevida, caso seja comprovada a originalidade da exposição, a mesma é protegida como obra. Tanto a lei brasileira (art.7º, inciso XIII da lei 9.610/98) quanto a americana (§ 103 do Copyright Act) garantem a proteção autoral a obras de compilação, com o óbice, presente na lei americana, dessa ser lícita.

Isso posto, não se nega a originalidade ou a criatividade da exposição de Richard Prince. Entretanto, sua execução não respeitou em nada os direitos de propriedade intelectual dos titulares originais das fotos.



terça-feira, 2 de junho de 2015

O Centro de Direitos Autorais do Youtube


Para os leitores desse blog que eventualmente sejam criadores de conteúdo para o youtube essa indicação pode ser muito útil. O youtube contém uma seção do seu site dedicada exclusivamente a esclarecer o funcionamento do website tanto para usuários quanto para uploaders de conteúdo.

Além de contar com um Centro de Criação o qual mostra os básicos sobre como produzir e publicar conteúdo, a seção conta ainda com uma aba dedicada exclusivamente à explicação dos fundamentos dos Direitos Autorais aplicados ao website.


Por exemplo, o vídeo acima explica de uma maneira cômica o funcionamento do procedimento de notificação para retirada de conteúdo (notice and takedown), o sistema Content ID e os fundamentos do Fair Use. Na página ainda se encontram instruções sobre como se utilizar adequadamente as ferramentas explicadas no vídeo. Explorando-se mais se encontra ainda uma explicação sobre o que seriam os Creative Commons e em quais ocasiões ele é aplicável.

Contudo, cabe lembrar que apesar de traduzido para o português, alguns dos sistemas explicados pelo Youtube foram baseados no direito norte-americano, nomeadamente o notice and takedown e o fair use. Paralelos nacionais poderiam ser encontrados respectivamente nos artigos 18 a 21 do Marco Civil da Internet e artigos 46 a 48 da lei 9.610/98, recomendando-se cautela na sua aplicação.