domingo, 3 de maio de 2015

Fundamentos da Decisão #5: o princípio do first come first served e o dissídio jurisprudencial da Terceira Turma do STJ


O STJ esteve recentemente bem ocupado com questões sobre a propriedade intelectual. Dessa vez no REsp 1238041, divulgado no dia 29/04, o qual tratava-se de resolver uma disputa entre duas empresas sobre a quem caberia o domínio de página da internet quando ambas possuíssem o mesmo nome.

A disputa era entre "Geração Comércio de Automóveis Ltda" e "Boeira e Boff Ltda". A primeira, ao tentar registrar na rede o domínio "Geração Automóveis" tomou ciência de que a segunda já registrara tal domínio e propôs ação cominatória para impedir que esta continuasse a fazer tal uso. Em contestação, Boeira e Boff alegou ter depositado pedido de registro de marca no INPI para "Geração Automóveis" em classe distinta e ter feito o registro do nome de domínio em junta comercial.

Tanto em 1º grau quanto em 2º grau o pedido formulado pela Geração Comércio de Automóveis foi considerado improcedente, por não ter se constatado infração ao princípio da especificidade, já tratado aqui no blog, só que com que com resultado diverso. Em sede de Recurso Especial a empresa invocou a violação dos artigos 124, XIX, 125, 129, § 1º, 130 e 131 todos da Lei n. 9.279/96, alegando, em síntese:
...que o sistema marcário brasileiro não é declaratório, mas atributivo, de modo que deve prevalecer na hipótese dos autos a prioridade do depósito. Isso porque na situação concreta não seria aplicável a exceção do § 1º do art. 129, porquanto as duas empresas litigantes utilizavam a marca semelhante há mais de seis meses do primeiro pedido de registro.
No relatório do Ministro Marco Aurélio Bellizze, seguido de forma unânime pelo restante da Terceira Turma do STJ, destacou-se primeiramente que as partes não debatiam a colidência de  marcas ante o INPI e sequer o fato da apelada ter feito o registro do nome de domínio na internet em primeiro lugar. Dispõe o voto:
Assim, seja por deter registro próprio junto ao INPI, seja por aplicação harmonizada do princípio da anterioridade e da territorialidade, a par de discutível a convivência das duas marcas sob o prisma da especialidade, deve-se reconhecer o direito de exploração da marca ao primeiro utente de boa-fé, in casu, o recorrido.
Quanto ao domínio utilizado na rede mundial de computadores aplicou-se o princípio "first come, first served". Tal princípio prevê que caso ambas as partes litigantes possuam válido registro de marcas iguais, como é o caso, aquela que primeiro fizesse o registro de seu nome na rede seria a válida possuidora do domínio.

Acho curioso esse voto ignorar o princípio da especialidade, tendo em vista que em recente julgado da mesma Terceira Turma, tratado no Fundamentos da Decisão #4, esse era o ponto fulcral da decisão. No caso anterior (REsp 1340933) o relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino discorre longamente sobre o princípio da especialidade e como este havia sido infringido, chegando a relativizar, inclusive, o procedimento de registro realizado pelo INPI. Neste, ainda que suscitada a manifestação pela parte apelante (art. 124, XIX da lei 9.279/96), o STJ se exime de analisar o princípio da especialidade alegando que o objeto da lide não era a discussão da marca. 

Entendo a existência de divergência de entendimentos entre os grupos de Ministros do STJ, porém, quando tal ocorre dentro da mesma Turma em julgados ocorridos dentro do período de um mês, isso se torna um fato preocupante. Para os leitores que quiserem fazer a comparação: o relatório do REsp 1340933 e sua certidão de julgamento e o relatório do REsp 1238041 e sua certidão de julgamento.

Nenhum comentário:

Postar um comentário