sábado, 30 de maio de 2015

Botafogo, Flamengo e Porta dos Fundos: sátira ou infração do direito de marca?

Essa camisa do Botafogo não é uma montagem
No dia 28.05 o grupo humorístico Porta dos Fundos lançou o vídeo "Patrocínio", o qual satiriza alguns dos patrocínios constantes da camisa do Botafogo durante uma fictícia partida de futebol a qual mostrava também a nova camisa do Flamengo, muito mais "limpa". Tal vídeo, já com mais de 1,5 milhões de visualizações no youtube e avaliação majoritariamente positiva, não foi bem recebido pela diretoria do clube alvinegro.

Conforme depoimento de Domingos Fleury, vice jurídico do Botafogo, para vários sites de notícias como Globo e Uol, esse vídeo teria sido uma tentativa infeliz de publicidade do Porta dos Fundos, do Flamengo e da Adidas (patrocinadora da camisa do Flamengo). Esse ainda afirmou o seguinte:
Eles utilizaram - sem autorização - a marca do Botafogo para vender a camisa nova do Flamengo feita pela Adidas. Vão responder judicialmente todos os três [Porta dos Fundos, Flamengo e Adidas] pelo prejuízo por uso indevido e tentativa de depreciar, usando, inclusive, uma camisa com material de péssima qualidade
Bernardo Santoro, diretor financeiro do Botafogo, complementou em sua página pessoal do facebook que a Adidas teria pago o canal de humor para promover a camiseta do Flamengo enquanto utilizava indevidamente a marca do Botafogo e que a empresa alemã seria processada por tal abuso.

Fugindo do mérito se houve ou não uma participação efetiva do clube rubro-negro na publicidade de sua camiseta e assumindo ter sido o vídeo produzido com fins exclusivamente humorísticos, a análise sobre se a marca do Botafogo foi utilizada de forma legal pelo grupo Porta dos Fundos merece ser feita.

Considerando o aspecto do direito da propriedade industrial os artigos 189 e 191 da lei 9.279/96 consideram como crime a reprodução da marca que possa induzir terceiros a erro ou sua utilização com fins econômicos. Do mesmo modo, o artigo 195 da mesma lei, incisos I e II, considera como crime de concorrência desleal a publicação de informações falsas acerca de concorrente com o fim de obter vantagem.

Primeiramente, pelas próprias características do grupo Porta dos Fundos e do vídeo não há o que se falar da existência de concorrência desleal, tendo em vista não haver concorrência direta em nenhum ramo de atividade. Em segundo, pelo próprio teor satírico do vídeo não há o que se falar da tentativa de induzir alguém em erro, dada a notoriedade do grupo de humor e a facilidade de se distinguir a atuação desse da do clube carioca.

Por fim, não foi a marca, mas sim a atuação do clube (exemplo 2) que foi utilizada para produzir o efeito humorístico do vídeo e a remuneração decorrente de sua visualização, impossibilitando a aplicação dos artigos 189 e 191 nesse caso por conta da marca Botafogo não ser elemento central para a produção do humor. Ademais, o art. 47 da lei 9.610/98 admite serem livres as paráfrases e paródias que não forem verdadeiras reproduções da obra originária nem lhe implicarem descrédito.

Isso posto, considerada somente a atuação do Porta dos Fundos o vídeo é legal. Caso a iniciativa e a ideia do vídeo tenham partido somente do grupo de humor as reclamações do Botafogo não passam de mero desgosto acerca de uma sátira feita das políticas de publicidade do próprio clube.

quinta-feira, 28 de maio de 2015

TED Talks: o ipod de 8 bilhões de dólares



Robert Reid é autor e empresário da área de música digital dos EUA. Nesse vídeo ele desmistifica alguns dados de perdas decorrentes da contrafação digital apresentados pela MPAA (associação que representa os maiores estúdios de filmes dos EUA como Walt Disney e Warner Bros). A análise do vídeo, ainda que seja de 2012, revela a dificuldade de se contabilizar e quantificar os dados trocados por meio da Internet e, especialmente, a necessidade de se atualizar os parâmetros utilizados para calcular quanto se perde com a troca digital de arquivos de maneira ilegal.

segunda-feira, 25 de maio de 2015

Fundamentos da Decisão #7: O Dicionário Aurélio e os requisitos da co-autoria

Na época de colégio era exigência ter um desses nas aulas de português.
De relatoria do Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, da 3º turma do STJ, o REsp 1417789, de 18/05/2015, opõe Joaquim Campelo Marques e Elza Tavares Ferreira contra a Posigraf S.A., atual editora do Dicionário Aurélio. Os autores tinham como objetivo receber indenização pela edição da obra "Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa", sob o argumento de serem co-autores da referida obra.

Tanto o juízo de primeiro grau quanto o TJPR negaram a argumentação dos proponentes considerando-os somente como 'meros assistentes' da criação da obra, não sendo, portanto, passíveis de receber indenização por sua edição, ao não serem considerados autores. Em sede de Recurso Especial os autores alegaram violação do art. 4º, inciso VI, letra "a", da antiga Lei de Direito de Autor (nº 5.988/73), pelo fato da 1ª edição da obra ter sido editada ainda na vigência da antiga codificação (1975).

O referido inciso dispõe que "para efeitos desta lei considera-se obra em colaboração, quando é produzida em comum por dois ou mais autores". O artigo 14 da mesma lei regulava a autoria da obra em colaboração, destacando-se aqui seu parágrafo único:
Não se considera colaborador quem simplesmente auxiliou o autor na produção da obra intelectual, revendo-a, atualizando-a, bem como fiscalizando ou dirigindo sua edição ou sua apresentação pelo teatro, cinema, fotografia ou radiodifusão sonora ou audiovisual.
Desse modo, o STJ manteve por unanimidade a decisão do TJPR a qual considerou os requerentes como mero assistentes, com base na argumentação legal supracitada e na súmula 7 do STJ, a qual proíbe reexame fático-probatório. A íntegra do acórdão pode ser encontrada aqui.

Contudo, justamente pela ausência de análise do conjunto fático-probatório dos autos o STJ falha em demonstrar a diferença entre um co-autor e um assistente/auxiliar, conceitos essenciais para a compreensão do acórdão em questão.

Pelo fato da obra para ser considerada como tal exigir a expressão intelectual criativa de seu autor, infere-se que co-autor é aquele o qual participa expressivamente de sua criação. Assim, é necessário que se perceba o input criativo do co-autor para ele poder exigir titularidade da obra. No caso em questão, pelo fato dos proponentes do recurso atuarem somente no trabalho de revisão do dicionário, sem contribuir com sua criatividade e individualidade para a criação da obra é que eles recaem como 'auxiliares' na acepção do parágrafo único do supracitado artigo 14.

Atualmente, essa disposição pode ser encontrada no artigo 15, § 1º da lei 9.610/98, no capítulo II acerca da autoria de obras intelectuais.

quinta-feira, 21 de maio de 2015

Itaquerão, Fielzão ou Arena Corinthians? Afinal, qual o nome do estádio do time paulista?

Fonte: pesquisa por 'Itaquerão' e 'Fielzão' no sistema e-marcas do INPI

Desde sua criação a 'Arena Corporativa Corinthians', nome oficial fornecido pelo clube, já recebeu extenso número de apelidos. Dentre esses 'Itaquerão' e 'Fielzão' são os mais conhecidos, muito para o desprazer do próprio clube.

Isso se dá em decorrência do clube estar a procura de um comprador dos Naming Rights do clube. Por essa prática uma empresa ou terceiro interessado adquire o direito de exibir publicamente sua marca ou símbolo como nome oficial de um local. Exemplos famosos são o Emirates Stadium (Arsenal-Ing), Allianz Arena (Bayern München-Ale) e Signal Iduna Park (Borussia Dortmund-Ale). 

Tendo em vista a importância da identificação do público com uma marca para ela ter sucesso, entende-se a preocupação do clube em evitar que seu estádio seja conhecido por outro nome, inclusive para fortalecer o poder de barganha com potenciais compradores. O antigo presidente do clube, Andrés Sanchez, fazia ostensiva campanha contra a denominação do estádio de 'Itaquerão', insistindo para que a mídia se referisse à ele como 'Arena Corinthians'.

Inclusive, para evitar a utilização indevida dos nomes 'Itaquerão' e 'Fielzão', o clube realizou o registro desses nomes perante o INPI com o expresso fim de não fazer uso deles e evitar que qualquer um o faça. Contudo, a lei 9.279/96 determina em seu artigo 143 que o registro das marcas caducarão dentro de 5 anos caso o clube não as explore no Brasil. Tal medida é prevista para estimular a concorrência e evitar que o Corinthians faça o que justamente pretende: assegurar as marcas para  as "enterrar", evitando um possível uso legal por parte de terceiros.

segunda-feira, 18 de maio de 2015

Ministério da Justiça prorroga prazo para debate da nova Lei de Proteção de Dados Pessoais

fonte: http://participacao.mj.gov.br/dadospessoais/

O Ministério da Justiça prorrogou até 5 de Julho o debate sobre o Anteprojeto da Lei de Proteção dos Dados Pessoais. Esta teria como objetivo proteger a dignidade e os direitos fundamentais da população no âmbito do tratamento dos dados pessoais, conforme refere o art. 5º, incisos X e XII da Constituição Federal, os quais assim dispõe:
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
XII- é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal; 
De acordo com o portal do Ministério da Justiça o texto discutido "é resultado de um amplo debate público promovido pelo Ministério da Justiça, em parceria com o Observatório Brasileiro de Políticas Digitais do Comitê Gestor da Internet no Brasil". Tal fora realizado durante 5 meses entre os anos de 2010 e 2011 e o resultado das discussões, à época, originaram a redação debatida.

A lei traz pontos de discussão interessante como, por exemplo, a necessidade de consentimento que um consumidor deve dar para ter seus dados armazenados por uma empresa  ou quanto tempo que esta pode ter essas informações em sua posse. A lei trata também, além de outros tópicos, do modo como esses dados adquiridos devem ser geridos e sua possibilidade de transferência para outrem, incluindo aí sua transferência internacional. Este ponto em específico é de extrema relevância tendo em vista que empresas de tecnologia como a Google já sofreram processos por conta da venda de dados pessoais de seus clientes para terceiros.

Caso o leitor possua interesse em debater o novo projeto de lei basta clicar aqui, ler e aceitar as condições e, enfim, começar a fazer seus comentários.

sexta-feira, 15 de maio de 2015

Lawrence Lessig e sua opinião acerca de leis que limitam a criatividade


Com o fim de trazer conteúdo diversificado para o Blog, essa publicação destina-se a divulgar um vídeo de Lawrence Lessig, ministrado em um evento do TED. Lawrence Lessig é professor norte-americano da Universidade de Harvard, um dos fundadores do Creative Commons e grande defensor da livre distribuição de conteúdos culturais. O TED (sigla em inglês para Tecnologia, Entretenimento e Design), por sua vez, é uma fundação privada sem fins lucrativos cujo auto-declarado objetivo é fazer palestras sobre "ideias que merecem ser disseminadas".

Acerca o conteúdo do vídeo em si, Lawrence comenta sobre a evolução dos meios de se disseminar ideias, a internet e a relação entre a lei autoral americana e os produtores de conteúdo. Sua opinião é extremamente relevante, pois, ainda que publicada 8 anos atrás, aborda diversas questões polêmicas sobre inovações tecnológicas, o fato dessas inovações sempre serem combatidas através da história e sua preocupação quanto ao modo como governo lida com a inovação que é a internet.

quarta-feira, 13 de maio de 2015

Por que não vemos um filme dos Vingadores com os X-men, Quarteto Fantástico e Deadpool?


O anúncio, no mês de fevereiro, de que o homem-aranha participaria do Universo Cinemático da Marvel trouxe, além da evidente alegria dos fãs, questionamentos sobre o porquê de não só ele, mas todos os personagens dos quadrinhos da Marvel não poderem ser utilizados nos filmes produzidos por Kevin Feige. Tal questionamento traz à tona alguns princípios do Direito de Autor que valem serem relembrados.

Ao criador de uma obra é concedido uma gama de direitos de natureza moral e patrimonial. Os direitos patrimoniais são aqueles que prevem, de maneira geral, a possibilidade de divulgação, reprodução e utilização geral  da obra para fins econômicos (ex: vide arts. 28 até 45 da lei 9.610/98). Os direitos patrimoniais podem ser cedidos ou licenciados para a gestão de terceiros; é isso que ocorre com, por exemplo, Stan Lee, o qual criou alguns dos personagens da imagem acima, mas cedeu a tutela da parte patrimonial de seus direitos para a Marvel.

A Marvel, titular dos direitos patrimoniais sobre vários personagens, pode ceder ou licenciar parte dos direitos que possui para terceiros. Por isso, enquanto a Marvel Studios não  existia ou não possuía a magnitude de atualmente, a criação de longa-metragens de seus personagens só era possível por meio de outros estúdios.

Para tanto, a Marvel colocava à venda somente a fração dos direitos patrimoniais de seus personagens referente à produção de filmes. Outras indústrias, como por exemplo a Sony no caso do homem-aranha, adquiriam esses direitos e, partir daquele momento, só ela poderia produzir longa-metragens contendo o aracnídeo, seus vilões e outros elementos acessórios ao personagem. No direito americano, a transferência dos direitos de autor é regulado das seções 201 até 205 do Copyright Act.

É por esse motivo, também, que os X-men, Quarteto-fantástico e Deadpool não aparecem no Universo Cinemático da Marvel, por conta dos direitos referentes à gravação de filmes pertencerem à 20th Century Fox (vide imagem abaixo). Desse modo, atualmente o único modo de ver todos esses heróis unidos é nas histórias em quadrinhos ou em eventuais animações cujos direitos a Marvel possua.


Marvel Characters Movie Studio Ownership 570x456 Answered: Which Studios Own Which Marvel Characters

segunda-feira, 11 de maio de 2015

Fundamentos da Decisão #6: quem pode reconhecer o alto renome de uma marca?


As marcas de alto renome são aquelas que, independente do ramo de atividade, são amplamente reconhecidas no mercado. Exemplos notórios são a Coca-cola, Microsoft e o McDonald's. Sua proteção está prevista no artigo 125 da lei 9.279/96, cuja redação prevê que "à marca registrada no Brasil considerada de alto renome será assegurada proteção especial, em todos os ramos de atividade". Uma pergunta que pode surgir do exposto acima é: quem tem competência para considerar uma marca de alto renome ou não?

Essa é a questão que a 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial se propôs a responder no acórdão referente à apelação nº 0000025-53.2013.8.26.0100 do TJSP de 06/05. O caso opunha a Companhia Brasileira de Distribuição, responsável pelos Supermercados Extra, e Extra Pharma Comercial, dona de drogarias de mesmo nome. A primeira intentou ação contra a segunda sustentando ser titular de registros da marca EXTRA pelo INPI, utilizada pela ré em sua EXTRA FARMA, e que tal proteção abarcaria as atividades de comércio e mercadorias em geral, inclusive farmácias e drogarias. Afirmou também a possibilidade de reconhecimento incidental do alto renome da marca extra pelo Poder Judiciário.

Tanto em 1º quanto eventualmente no 2º grau a ação foi considerada improcedente. Primeiramente, no tocante ao alto renome o Tribunal declarou:
 Para que uma marca seja reconhecida como de alto renome, indispensável a sua declaração pelo INPI, órgão competente para tanto, por meio de um procedimento administrativo próprio de iniciativa do titular da marca. Ao Poder Judiciário incumbe exclusivamente eventual análise da legalidade do ato administrativo, sendo descabido o reconhecimento do alto renome incidentalmente, como pretende a apelante, sob pena de ofensa ao princípio da separação de poderes.
Assim sendo, com o não reconhecimento por parte do INPI do alto renome, os "Supermercados Extra" não gozam da proteção prevista no art. 125 da Lei de Propriedade Industrial, ainda que possuam reconhecimento e prestígio ante a população. Para fundamentar essa decisão citou-se o AgRg no REsp 1165653/RJ do STJ.

Com relação à atuação no mesmo ramo de atividade o Tribunal considerou só ser válida a proteção do nome EXTRA quando usado em conjunto com as palavras "super" ou "supermercados", de modo que a proteção da expressão isolada seria impossível. Pelo fato da empresa ré utilizar-se da expressão EXTRA FARMA como título de estabelecimento e não EXTRA SUPER ou EXTRA SUPERMERCADOS a infração não ocorreria.

Ademais, o TJSP considerou que por atuarem em diferentes ramos de atividade e possuírem diferente público-alvo, não haveria possibilidade de confusão entre os serviços oferecidos pelas duas empresas de modo a causar prejuízo para a parte autora. Como fundamentação nesse ponto o Tribunal utilizou o REsp nº 773126/SP do STJ.

sábado, 9 de maio de 2015

Obra de Adolf Hitler entrará em domínio público a partir do ano que vem



Mein Kampf (Minha Luta), a controversa obra de Adolf Hitler, está prevista para entrar em domínio público a partir de 1 de Janeiro de 2016. Com a morte do Ditador em Abril de 1945, o prazo de 70 anos de proteção dos direitos autorais da obra após seu falecimento expira agora em 2015.

Isso significa que a partir do próximo ano qualquer um pode reproduzir, distribuir e fazer uso público dessa obra. Contudo, o governo bávaro, atual detentor de seus direitos, não se mostrou nem um pouco feliz com a possibilidade de republicação da mesma, cogitando sua proibição por conter propaganda nazista.

A entrada em domínio público após 70 anos da morte do autor é prevista no artigo 64 do Código de Direito de Autor Alemão. No direito brasileiro essa previsão pode ser encontrada no artigo 41 da Lei 9.610/98, com a seguinte redação:
Art. 41. Os direitos patrimoniais do autor perduram por setenta anos contados de 1º de janeiro do ano subseqüente ao de seu falecimento, obedecida a ordem sucessória da lei civil.
Ainda que a possibilidade de publicação irrestrita da obra represente motivo de preocupação, especialmente por parte do governo alemão, há associações que acreditam que o público deve poder ter acesso à essa obra para "desmistificá-la". Por isso, o Instituto de História Contemporânea de Munique pretende publicar uma edição especial do Main Kampf de 2.000 páginas das quais apenas 780 seriam da redação original. O restante conteria comentários e opiniões de pesquisadores e especialistas sobre o assunto.

quinta-feira, 7 de maio de 2015

Inicia-se o período de sistematização do Marco Civil da Internet e usuários podem enviar suas minutas

Fonte: http://participacao.mj.gov.br/marcocivil/sistematizacao/

Com o término do debate público sobre o Marco Civil da Internet no último dia 30/04, inicia-se agora uma nova fase do procedimento de regulamentação. De acordo com dados do próprio Ministério da Justiça, durante os 82 dias de debate público foram criadas 339 pautas com 1109 comentários dentre as 48.823 visitas únicas. Por esse motivo o trabalho agora é organizar toda essa informação em um documento coeso.

Para tanto o Ministério da Justiça iniciou na última semana o período de sistematização, cujo objetivo final é a elaboração de uma minuta do texto do decreto. Os usuários, portanto, terão acesso a todo o histórico dos 3 meses debates e poderão enviar suas próprias sugestões de minuta da regulamentação do Marco Civil. Lembra-se, contudo, que as propostas deverão ser feitas somente com base no material já discutido, dentro dos eixos  neutralidade, privacidade na rede, guarda de registros e outros temas e considerações

Essa é um oportunidade única de se participar ativamente do debate sobre a regulamentação do marco civil, por isso aos interessados os envios de proposta poderão ser feitos por meio desse link.

Links úteis:

terça-feira, 5 de maio de 2015

Alta Corte do Reino Unido determina o bloqueio de sites que ofereçam acesso ao Popcorn Time


No último 28/04 a Alta Corte do Reino condenou as cinco maiores provedoras de acesso à rede da região (Sky, British Telecom, EE, Talk Talk e Virgin) a bloquearem acesso a cinco sites que oferecem acesso ao Popcorn Time. Este software, já explicado aqui na blog, trata-se essencialmente de um "Netflix Pirata", o qual permite acesso à filmes e séries de maneira gratuita, porém ilegal.

Tal condenação veio após ação movida por Fox, Universal Studios, Warner Bros, Paramount Pictures, Disney e Columbia Pictures, todas integrantes da Motion Picture Association of America (MPAA). Tal ação foi movida com base no seção 97A do Copyright Designs and Patents Act de 1988, lei britânica a qual regulamenta os direitos de propriedade intelectual no Reino Unido. Esse artigo em específico regula as ordens de bloqueio de websites enviadas a provedores de acesso à rede quando esses disponibilizam conteúdo ilegal.

O juiz Birss concedeu o pedido de bloqueio formulado pelos membros do MPAA utilizando, entre outros, o seguinte argumento:
É evidente que a aplicação Popcorn Time é utilizada com o propósito de se assistir conteúdo pirata na internet e, de fato, é manifestamente esse seu propósito. Ninguém realmente utiliza o Popcorn Time com o objetivo de se assistir conteúdo legalmente disponível. Pode-se, portanto, simpatizar-se inteiramente com os reclamantes no sentido de bloquear suas operações e uso. 
Assim, o juiz acolheu as alegações formuladas com base na seção 97A, por conta da manifesta utilização do Popcorn Time para infringir o Direito de Autor dessas empresas. Contudo, questiona-se a efetividade dessa decisão, tendo em vista quão facilmente esse bloqueio pode ser contornado. Inclusive, a equipe responsável pelo programa já trabalha em um sistema totalmente baseado no sistema peer-to-peer, no qual a dependência de um servidor central será inexistente, conforme reportagem do Tecmundo.

A título de comparação, no direito brasileiro o pedido de retirada de conteúdo por parte de provedores de acesso à rede é regulado pelo artigo 19 da lei 12.965/14 (marco civil da internet), com especial enfoque dado ao § 2º, o qual fala das infrações ao direito de autor.

Caso haja interesse, a integra da decisão judicial proferida pela Alta Corte do Reino Unido pode ser encontrada aqui.

domingo, 3 de maio de 2015

Fundamentos da Decisão #5: o princípio do first come first served e o dissídio jurisprudencial da Terceira Turma do STJ


O STJ esteve recentemente bem ocupado com questões sobre a propriedade intelectual. Dessa vez no REsp 1238041, divulgado no dia 29/04, o qual tratava-se de resolver uma disputa entre duas empresas sobre a quem caberia o domínio de página da internet quando ambas possuíssem o mesmo nome.

A disputa era entre "Geração Comércio de Automóveis Ltda" e "Boeira e Boff Ltda". A primeira, ao tentar registrar na rede o domínio "Geração Automóveis" tomou ciência de que a segunda já registrara tal domínio e propôs ação cominatória para impedir que esta continuasse a fazer tal uso. Em contestação, Boeira e Boff alegou ter depositado pedido de registro de marca no INPI para "Geração Automóveis" em classe distinta e ter feito o registro do nome de domínio em junta comercial.

Tanto em 1º grau quanto em 2º grau o pedido formulado pela Geração Comércio de Automóveis foi considerado improcedente, por não ter se constatado infração ao princípio da especificidade, já tratado aqui no blog, só que com que com resultado diverso. Em sede de Recurso Especial a empresa invocou a violação dos artigos 124, XIX, 125, 129, § 1º, 130 e 131 todos da Lei n. 9.279/96, alegando, em síntese:
...que o sistema marcário brasileiro não é declaratório, mas atributivo, de modo que deve prevalecer na hipótese dos autos a prioridade do depósito. Isso porque na situação concreta não seria aplicável a exceção do § 1º do art. 129, porquanto as duas empresas litigantes utilizavam a marca semelhante há mais de seis meses do primeiro pedido de registro.
No relatório do Ministro Marco Aurélio Bellizze, seguido de forma unânime pelo restante da Terceira Turma do STJ, destacou-se primeiramente que as partes não debatiam a colidência de  marcas ante o INPI e sequer o fato da apelada ter feito o registro do nome de domínio na internet em primeiro lugar. Dispõe o voto:
Assim, seja por deter registro próprio junto ao INPI, seja por aplicação harmonizada do princípio da anterioridade e da territorialidade, a par de discutível a convivência das duas marcas sob o prisma da especialidade, deve-se reconhecer o direito de exploração da marca ao primeiro utente de boa-fé, in casu, o recorrido.
Quanto ao domínio utilizado na rede mundial de computadores aplicou-se o princípio "first come, first served". Tal princípio prevê que caso ambas as partes litigantes possuam válido registro de marcas iguais, como é o caso, aquela que primeiro fizesse o registro de seu nome na rede seria a válida possuidora do domínio.

Acho curioso esse voto ignorar o princípio da especialidade, tendo em vista que em recente julgado da mesma Terceira Turma, tratado no Fundamentos da Decisão #4, esse era o ponto fulcral da decisão. No caso anterior (REsp 1340933) o relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino discorre longamente sobre o princípio da especialidade e como este havia sido infringido, chegando a relativizar, inclusive, o procedimento de registro realizado pelo INPI. Neste, ainda que suscitada a manifestação pela parte apelante (art. 124, XIX da lei 9.279/96), o STJ se exime de analisar o princípio da especialidade alegando que o objeto da lide não era a discussão da marca. 

Entendo a existência de divergência de entendimentos entre os grupos de Ministros do STJ, porém, quando tal ocorre dentro da mesma Turma em julgados ocorridos dentro do período de um mês, isso se torna um fato preocupante. Para os leitores que quiserem fazer a comparação: o relatório do REsp 1340933 e sua certidão de julgamento e o relatório do REsp 1238041 e sua certidão de julgamento.

sexta-feira, 1 de maio de 2015

Fundamentos da Decisão #4: A Proibição das Bolachas Tic-Tac

Sem dúvida o leitor já ouviu falar das pastilhas Tic-Tac, mas e se um dia você entrasse no supermercado e visse um pacote de bolachas Tic-tac como a da foto acima, será que isso te traria confusão? É mais ou menos essa a pergunta que o STJ se propôs a responder ao julgar o REsp 1340933, envolvendo a Ferrero do Brasil (produtora das pastilhas) e a Cory Ltda (produtora das bolachas).

No caso, publicado no dia 27/04, a Cory, ao tentar fazer o registro da marca supra-citada, teve seu pedido indeferido pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI). Os fundamentos foram a semelhança do nome e a atuação no mesmo ramo de atividade da empresa Ferrero. Cabe lembrar ser possível o registro de duas marcas nominalmente iguais, contanto que atuem em diferentes ramos de atividade, não podendo assim, trazer confusão ao consumidor, trata-se esse do princípio da especialidade.

Após proposição de ação constitutiva do registro e eventual apelação, o TRF da 3ª região decidiu pela "inexistência da possibilidade de confusão no espírito dos consumidores entre o biscoito de chocolate recheado produzido pela apelante e as balas ou pastilhas fabricadas pelas apeladas", concedendo, portanto, o direito de registro e uso da marca Tic-tac para as bolachas da Cory Ltda.

Tanto o INPI quanto a Ferrero interpuseram REsp alegando, em suma, a violação do art. 535 do CPC e do art. 124, XIX, da lei 9.279/96, o qual dispõe:

Não são registráveis como marca reprodução ou imitação, no todo ou em parte, ainda que com acréscimo, de marca alheia registrada, para distinguir ou certificar produto ou serviço idêntico, semelhante ou afim, suscetível de causar confusão ou associação com marca alheia;
Na decisão do STJ, prolata pelo Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, argumentou-se pela procedência do REsp, indeferindo-se o pedido de registro solicitado pela Cory Ltda. Destarte o princípio da especialidade das marcas supracitado, o relator destaca que  

... referidos produtos devem ser considerados afins, uma vez que se inserem no mesmo nicho comercial (nomeado apropriadamente no acórdão recorrido como de "guloseimas"), visando a um público consumidor semelhante e, principalmente, utilizando os mesmos canais de comercialização
Assim sendo, apesar de estarem em diferentes classes da Classificação Internacional de Produtos e Serviços, esta não configuraria como tabela estanque, estando presente sim a semelhança entre os produtos e a possibilidade de causar confusão no consumidor.

A íntegra do voto do relator você pode encontrar aqui.